Muito se especula sobre os motivos que fizeram a novela “Salve
Jorge”, de Glória Perez, derrubar a audiência do horário das 21h.
Fala-se muito do efeito “Avenida Brasil”, que deixou “órfãos” do
conflito de Carminha (Adriana Esteves) e Nina (Débora Falabella). Também
culpou-se o horário de verão, o horário eleitoral e a temática repetida
desde “O Clone” e “Caminho das Índias”.
Em entrevista à colunista Mônica Bergamo nesta quinta (29),
Glória justificou os índices baixos que sua história tem alcançado por
conta do preconceito social que os brasileiros teriam contra pessoas que
vivem no morro do Alemão, principal locação da trama.
Em parte é
verdade, mas o problema de “Salve Jorge” parece ser mais de narrativa
que de tema. Fosse assim, filmes como “Cidade de Deus” e “Tropa de
Elite” não seriam campeões de bilheteria e novelas como “Vidas em Jogo”,
da Record, não teriam alcançado altos índices de audiência na
concorrência.
Em sua primeira cena, “Salve Jorge” parecia que ia
embarcar em uma tendência bastante comum nos seriados americanos e que o
autor João Emanuel Carneiro aplicou, com erros e acertos, em “Avenida
Brasil”: a narrativa fragmentada, que mostra concomitantemente fatos
ocorridos no passado e no presente.
“Lost” segurou seu público
assim, “Revenge” idem, “American Horror Story” idem. Quando o
telespectador vê Morena (Nanda Costa) sendo vendida e, logo após,
fugindo, cria-se uma expectativa pelo destino da heroína, especialmente
após o corte e o retorno aos meses que precedem aquele fato.
No
entanto, logo após esse pequeno salto no tempo, a narrativa volta a ser
convencional e arrastada (especialmente pelo excesso de tramas e
personagens). O telespectador se entedia com a repetição da fórmula país
exótico, dancinha, bordão, marketing social, e o primeiro momento de
empatia se dissolve.
Isso porque a forma de leitura do espectador
mudou desde que a leitura fragmentada proporcionada pela internet
subverteu o modelo vigente de narrativa linear. Ninguém mais tem
paciência para prólogos intermináveis que, após cem capítulos, chegarão a
parte da conclusão. As pessoas querem ver e ouvir histórias que façam
sentido em meio à desconexão de ideias, porque é assim que percebem a
vida atualmente.
Além desse aspecto, fragmentar a história em dois
tempos proporciona ao autor uma maior facilidade em criar ganchos e
trazer fatos novos ao público, o que, por sua vez, dá dinâmica ao
desenrolar da trama.
Quem provavelmente sofrerá do mesmo mal de
Glória Perez será o autor Manoel Carlos, o segundo na fila das 21h. Mais
uma vez sua protagonista será uma Helena que provavelmente vive no
Leblon e que certamente terá os momentos mais prosaicos de sua vida,
como cafés da manhã intermináveis, levados ao público. Em um mundo de
hypertexto, quem ainda tem paciência para acompanhar uma narrativa
linear? Só se ela for cheia de efeitos especiais, explosões, tecnologia
3D e outros elementos que, sabemos, a novela das 21h ainda não oferece.
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